terça-feira, 27 de julho de 2010

LEMBRANÇAS DO TERROR - Alvamar Queiroz




Por volta de 1965, estudante do ensino secundarista, Alvamar Costa de Queiroz teve o primeiro contato com militantes do Partido Comunista Brasileiro – PCB, que lhe mostravam revistas de origem russa sobre o socialismo, a igualdade e a distribuição da riqueza. “Quando eu olhava pro nosso povo e via a miséria, isso me dava uma revolta. E daí eu começava a sonhar que a única saída era o socialismo, o comunismo”, expressou.

Alvamar, estudante do colégio Padre Monte, participava do encontro que havia com estudantes, intelectuais, anarquistas e artistas, na livraria Universitária, na Pracinha das Cocadas (atual praça Kennedy) no bairro da Cidade Alta. O despertar do jovem idealista para a leitura dos clássicos (Máximo Gorki, Dostoievski, Victor Hugo) veio da convivência com essas pessoas. “Eu lembro de uma pessoa que eu tenho a maior admiração; o Luiz, da antiga Universitária, de Ismael Pereira. Uma figura interessante, um intelectual; de uma capacidade muito grande de incentivar a leitura e ele me incentivava muito à leitura. Luiz foi o maior livreiro que eu conheci até hoje”, disse.

Posteriormente vieram as leituras mais especializadas sobre o materialismo dialético, o materialismo histórico, o marxismo, que eram de difícil compreensão, pela pouca idade do jovem Queiroz. “Praticamente eu não tive uma infância e uma juventude. Eu não consegui viver, na minha época, a brincadeira das crianças. Com dezesseis anos eu já tava interessado nas questões sociais”, afirmou.

Filho de uma família católica conservadora, Queiroz foi coroinha nas missas do padre Nivaldo Monte (atualmente Arcebispo Emérito de Natal) e da igreja do Bom Jesus, no bairro da Ribeira, como estudante do colégio Salesiano. “Tive a mala arrumada pra ir pro Seminário e depois desisti”, externou.

O pai, ex-combatente, era de um arraigado patriotismo e anticomunista. “A relação com a família era conflituosa. Eu passava uma imagem de uma pessoa inconformada e de muita revolta com a questão social. Meu pai, por ser um homem sem conhecimento, não conseguia entender esse universo, ele não entendia que revolta era essa, que inconformação com a vida era essa, se ele mantinha a casa com comida, com estudo, com roupa, com tudo que nós necessitávamos”, explicou.

Já como militante ativista e estudante do Atheneu Norte-rio-grandense conheceu, através da Juventude Operária Católica – JOC, o padre Thiago Theisen (atual pároco de Santa Catarina) que realizava um trabalho na Favela do Maruim, no bairro das Rocas. “Um momento interessante da minha vida foi quando eu conheci o padre Thiago, das Quintas. Esse padre, uma figura extraordinária, que tinha um trabalho muito interessante no Maruim. Ali nós fazíamos um trabalho social; distribuíamos alimentos da Aliança para o Progresso. A gente tirava o alimento das latas, pra não ficar aquela Aliança para o Progresso; nós tínhamos uma posição contrária ao governo americano. Daí nós fazíamos a distribuição de alimentos naquela região, com o objetivo de sensibilizar e conscientizar os trabalhadores para a sua realidade. Era esse o nosso trabalho junto à igreja”, disse.

Depois de passar pela Frente Revolucionária Popular – FREP, pertencente ao Partido Comunista Brasileiro Revolucionário – PCBR, e Partido Comunista Revolucionário – PCR, Alvamar foi para a prisão em 1971, onde ficou recolhido por um ano, entre o 16º RI, Base Naval de Natal, Colônia Penal Dr. João Chaves e Batalhão de Engenharia. A prisão foi decorrente de pichações: “Abaixo Meira Matos!”, com lápis cera, contra a vinda do general Carlos de Meira Matos, do 16º Batalhão de Caçadores, de Cuiabá-MT, que estava para chegar a Natal. O general foi um dos ideólogos do regime militar e autor de livros como “Pensamento Revolucionário Brasileiro”. “Isso foi suficiente pra uma prisão, pra tortura, pra um desmantelo de vida. A pessoa que passa pela tortura (psicológica e física) desestrutura a pessoa. Eu cheguei a ser preso cinco vezes, antes de ficar recolhido durante um ano”, desabafou.

Após esse período de reclusão e tortura, Alvamar casou-se com uma companheira de militância, mas teve que seguir sozinho para a casa de familiares no Rio de Janeiro. De lá foi para Brasília, através de um parente deputado federal, com quem pensou em pegar algum dinheiro para sair do Brasil. Foi desaconselhado pelo deputado e passou 17 anos na capital federal. Não podia trabalhar nem estudar. “Ao sair da prisão, eu tive um contato com um entalhador, aqui do Rio Grande do Norte, chamado Manxa. Muito conhecido, muito famoso. E com o Manxa eu aprendi muito a entalhar, a incrustar cobre na madeira. Esse aprendizado foi muito bom pra minha vida, porque ao chegar a Brasília eu fui pra feira hippie; e na feira hippie eu passei a fazer parte daquele grupo que fazia as bugigangas pra sobreviver”, afirmou.

Em 1975, em Brasília, com muita depressão, angústia e conflito interior, Alvamar conheceu o Budismo. A partir daí reascendeu a esperança e a possibilidade de ajudar a construir a felicidade dos outros sem ser alienante.

Fazia concurso público e não ficava em alguns empregos, pois o passado de militante político ia de encontro a Lei de Segurança Nacional.

Após ter parado os estudos no segundo ano clássico, no Atheneu Norte-rio-grandense, concluiu o estudo secundário em um supletivo, em Brasília. Em 1978 formou-se em Geografia (licenciatura plena); dedicou-se ao ensino em várias escolas.

Em 1981, através de concurso, conseguiu ficar na Secretaria Especial de Meio Ambiente. Em 1990, a Secretaria passou a ser o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente – IBAMA. “Eu dizia muito que era a última coisa que eu queria ser na vida era servidor público. Por isso que muitas vezes eu passava num concurso e abandonava, porque não concebia esse ritmo muito lento, muito burocrático, muito difícil de executar as coisas. Quando eu abandonava o serviço público, caía num biscate. Eu fiz de tudo pra sobreviver (tentei ser vendedor, ser representante). Na Secretaria do Meio Ambiente eu dizia pras pessoas, desse ano eu não passo. Aí eu fui tomando gosto,” assinalou.

Participou da criação do PT; voltou ao trabalho de militante, nas favelas, com os sem-teto; participou do processo de redemocratização, através da aprovação da emenda Dante de Oliveira e foi candidato a deputado federal, em 1986. Especializou-se em Desertificação, em Educação Ambiental e em Gestão Ambiental.

A Secretaria Nacional de Meio Ambiente enviou Alvamar para o Nordeste, com a missão de sanar irregularidades em unidades da região. Com a intenção de voltar para a sua terra, o geógrafo ficou definitivamente como chefe responsável pelas estações ecológicas do Seridó/RN e Mamanguape/PB. Deixou um substituto na Paraíba e ficou trabalhando somente no Seridó. Nesse período fez mestrado e doutorado na área de educação, na UFRN.

Na época em que atuou na Estação Ecológica do Seridó, casou-se pela segunda vez com uma caicoense.
Hoje, como praticante do Budismo e vice-responsável da organização, em nível de Estado, disse: “É nessa organização que eu reconstruí a minha vida, que eu refiz o meu pensar e minha trajetória de vida. Eu entendo que cada ser humano tem a centelha da iluminação, por pior que ele seja. Essa centelha precisa ser tocada; no momento tocada, você pode mudar sua vida e começar a construir um mundo de paz”.

Atualmente Alvamar Costa de Queiroz é gerente executivo do IBAMA. “Os servidores do órgão indicaram o meu nome. No dia em que eu sair daqui, eu sou aquele educador que vai voltar lá pra salinha da Educação Ambiental”, finalizou.

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Homenagem a Nilson Patriota




Touros é um município com uma cultura e uma história riquíssimas. Ontem, 13 de julho, segundo matéria do site www.folhadomatogrande.com.br, foi realizada uma homenagem póstuma a Nilson Patriota, na Academia Norte-rio-grandense de Letras.

O presidente da Academia, Diógenes da Cunha Lima, sugeriu, em homenagem a Nilson Patriota, que fosse erguida uma estátua em bronze, tamanho natural, no centro da cidade de Touros.

É uma vergonha vermos que a homenagem prestada ao escritor, na cidade, é o nome em uma biblioteca, cuja arquitetura do prédio é de uma loja de móveis ou armazém, para satisfazer a interesses próprios.

A cidade de Touros tem espaço suficiente para que seja construída uma biblioteca pública, com ambientação apropriada para o ato da leitura, além da colocação da estátua, com todas as informações biográficas do homenageado.

Administrar não é pires na mão em Brasília. É o exercício da criatividade, vontade política e gestores competentes, para que se possa mudar a realidade de muitas cidades, principalmente nas regiões mais carentes do Brasil.

sábado, 3 de julho de 2010

LEMBRANÇAS DO TERROR - Marcos Maranhão


Último depoimento dado por Marcos Maranhão antes de morrer

 
Marcos Maranhão

O depoimento de hoje relata um pouco da trajetória de Marcos Cavalcanti Maranhão, que não foi uma vítima direta da ditadura militar de 1964, mas estava na relação dos Anistiados políticos do RN, como representante do seu pai, Djalma Maranhão, ex-prefeito de Natal, retirado do poder pela ditadura militar e impedido de exercer o mandato por impeachment votado pela Câmara Municipal de Natal, no dia 02 de abril de 1964. Marcos, devido a problemas graves de saúde, enfrentados há cerca de 10 anos, morreu em casa, no dia 10 de julho de 2006.

“Marcos, meu filho; um grande abraço. O homem que se preocupa em ocupar o seu lugar dentro da sociedade em que vive, descortinando horizontes em novos ângulos, marcando a transição de um período que se ganha quando se ultrapassa a maioridade...
Entre os esportes e a literatura, preferiu ser um intelectual, um devorador de livros, deixando permanentemente desarrumada a biblioteca do pai... Meu filho: esta carta não é nenhum testamento... É a conversa franca de dois homens. Um mais idoso e outro mais jovem. Ainda espero viver bastante. E a vida não é somente luta e trabalho. O homem e a mulher necessitam divertir-se. A outra face. O lado ameno. Música e poesia. Um pouco de vinho, sim vinho, porque o vinho está nas Escrituras!... E na tua idade é a ideal para todas estas coisas. Aproveita. Aproveita bem.”
Este é o trecho de uma carta enviada, de Montevidéu, Uruguai, datada de 20 de agosto de 1968, por Djalma Maranhão, durante o seu período de exílio, para o filho Marcos Cavalcanti Maranhão, quando Marcos completou 21 anos. A carta está publicada no livro “Cartas de um Exilado”, juntamente a uma série de outras cartas enviadas por Djalma, para amigos e familiares.

Marcos foi estudante do Atheneu Norte-rio-grandense e a sua formação foi nas áreas da Sociologia, da História e do Direito. Não foi um estudante que demonstrasse interesse pelo ingresso na atividade política, como eram as tendências do seu pai Djalma e do tio Luis Maranhão Filho. “Quem Não passou pelo Atheneu pode dizer aquele verso: passou pela vida e não viveu. O Atheneu foi a grande escola de civismo, a grande escola de companheirismo. Era uma turma muito entusiasmada, muito boa; de grande amigos”, relatou Marcos.

Djalma Maranhão

Segundo relata Mailde Galvão, no livro: “1964. Aconteceu em Abril”, Djalma Maranhão foi prefeito de Natal até 02 de abril de 1964. “Não consegui testemunhas do momento em que foi efetuada a prisão; apenas dois funcionários viram o prefeito descer a escada de saída para a rua, escoltado por oficiais do Exército... O prefeito foi conduzido ao Quartel-General do Exército, àquele tempo localizado na praça André de Albuquerque; e levado a presença do coronel Mendonça Lima... O coronel lhe propôs que renunciasse ao cargo de prefeito e, em troca, teria assegurada a liberdade. O prefeito recusou em nome da honra e do povo que o elegeu; foi então, levado preso, incomunicável, para uma cela do quartel do 16º RI”. (GALVÃO, 2004 a, p. 49).

Durante o período de exílio de Djalma Maranhão, no Uruguai, Marcos viajou diversas vezes na companhia da sua mãe, Daria Maranhão, a Montevidéu. ...“Marcos, que não o acompanhou ao exílio, mas visitou-o quatro vezes, com passagens oferecidas pelo então senador Dinarte Mariz. Marcos recorda a enorme saudade que ele sentia e a ansiedade com que aguardava o fim da ditadura.” (GALVÃO, 2004 a, p.218).

“Meu pai, Djalma Maranhão, jornalista, diretor e dono de jornal, deputado estadual, deputado federal, foi uma das grandes figuras do Rio Grande do Norte. Foi cassado pelo golpe de 1964; depois ele foi libertado da prisão, por habeas-corpus do Supremo Tribunal Federal, e foi para Montevidéu. Lá ele morreu de enfarte e foi sepultado aqui em Natal, no cemitério do Alecrim. Eu tenho muita honra em ser filho de Djalma Maranhão. Fico, ainda, emocionado, hoje, em falar sobre esta figura tão ilustre. Um homem tão honesto; um homem tão organizado, no sentido de esperar a volta do Brasil à comunidade democrática. Djalma Maranhão deveria ser todos os dias lembrado nas escolas, nas escolas publicas, nas escolas particulares, como um grande a ser seguido aqui no Rio Grande do Norte”, desabafou Marcos Maranhão.

Marcos, depois de formado, advogou e foi professor na antiga Faculdade de Sociologia da Fundação José Augusto, onde ensinou Sociologia e Ciência Política. Foi professor da Academia de Polícia e freqüentou a Escola Superior de Guerra – ESG.

A atividade a que Marcos se dedicou com paixão, segundo relato dos amigos, foi a pesquisa histórica e o estudo da vida dos vultos históricos brasileiros. “Eu publiquei O Forte dos Reis Magos e a História Colonial do Rio Grande do Norte, aliás, com o prefácio muito honroso de Enélio Petrovich,” disse Marcos.

Marcos Maranhão foi uma figura polêmica em sua geração, por ser uma vítima indireta do golpe militar de 1964, já que seu pai, Djalma Maranhão, foi impedido de exercer a cidadania como político, no exercício do mandato, e ele (Marcos) ser tão próximo das autoridades militares, sendo convidado para diversas palestras e com uma infinitude de condecorações e diplomas oferecidos pelas forças militares como: Medalha de Ouro de Amigo da Marinha; Diploma de colaborador Emérito do Exército, o que pode ser atestado na sala da residência em que o historiador residia.

Por indicação de um grupo de intelectuais, Marcos Maranhão foi indicado para sócio efetivo do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte – IHG. Foi admitido como vice-orador da entidade. “A minha convivência com Marcos foi no plano cultural, aqui no Instituto. Ele é um estudioso da nossa história, pesquisador. Ele lia uma página e reproduzia totalmente de cor. Dinarte, era a quem ele idolatrava; é natural, que apoiou o pai dele. Quando o pai dele morreu, trouxe (Dinarte) os restos mortais dele (Djalma) pra Natal. Ele tem essa gratidão e é muito justo. Em admirar o pai e ao mesmo tempo enaltecer os vultos das Forças Armadas, que ele era conhecedor profundo da vida de Tamandaré, de Caxias, não vejo nenhum conflito”, relatou Enélio Petrovich.

Marcos Maranhão casou-se em 1986, com Lúcia Fontoura, professora da UFRN.

Nos jornais “A Tribuna do Norte, em 21 de janeiro de 2001 e “A Verdade”, de fevereiro do mesmo ano, Marcos publicou um longo artigo intitulado: “Djalma Maranhão”, descrevendo a trajetória do político, nacionalista, ser humano, cidadão e pai de família, que foi Djalma Maranhão.

Marcos Maranhão foi Procurador Geral do município de Natal e Assessor jurídico do Departamento Estadual de Trânsito – DETRAN.

Este depoimento contou com a colaboração do próprio Marcos Maranhão, gravado no dia 16 de junho; do advogado Enélio Petrovich e da irmã de Marcos, Ana Maria Cavalcanti Maranhão, que reside atualmente em Brasília.